Prefácio para a apoteose

terça-feira, 25 de agosto de 2009 | |

Movimento... Sem utilizar de um referencial inercial para classificar um fenômeno tão intrínseco da realidade, e tão trivial que o desencadeamento de eventos acaba por tornar a atenção ao evento mais cautelosa uma ação não menos que irrisória, a observação que quero me voltar não é para a mudança de posição em si, que caracteriza o movimento, é para o movimento da realidade, para a fluidez.

A antiga declaração, “tudo flui”, que é a afirmação mais conhecida de Heráclito de Éfeso, e um dos pilares do seu sistema filosófico, se refere exatamente à realidade. A realidade flui, é mutável, está em movimento, o que não lembram é que essa fluidez é o produto da luta, e que essa luta ocorre somente entre divergentes, uma mútua divergência, e isso foi proposto pelo próprio Heráclito. Mas o fato é que, esse detalhe é como o nosso próprio nome pronunciado por nós mesmo, justamente por que faz parte da nossa realidade cotidiana, é normal, mas não deixa de ser admirável, e quando observado com mais rigor de detalhes, descobrimos realmente o óbvio, a luta existe, está lá, mas inevitavelmente é trivial.

É na luta dos contrários que a realidade se mostra, o quente e o frio, o bem e o mal, o amor e ódio, a dor e o prazer, a fé e a descrença. Não quero aqui tentar provar o sistema de Heráclito, seria pretensioso da minha parte, deixo isso para os parmenesianos. A realidade possui efeitos constantemente presentes que chegamos a acreditar que eles são tão naturais como o ato de respirar, pois para alguns crer é tão natural quanto respirar. O que o movimento da realidade na sua fluidez, nos demonstra na luta dos opostos, é que a fé existe por que a descrença também existe, enquanto em alguns casos tende ao inatismo, em outros ela vem pela experiência, é posteriori. Uma canção chamada contrários, de Fábio de Melo, diz algo parecido, “só quem pôde duvidar, pôde enfim acreditar”, o que me dá espaço para citar um grande filósofo cristão, Gilbert K. Chesterton que dizia, “para o insano a insanidade é totalmente prosaica, por que é totalmente verdadeira... a poesia mais louca da insanidade só pode ser apreciada por quem é sensato”, e assim utilizar das suas palavras para expor de forma mais elegante a luta cantada na canção: para o descrente a descrença é totalmente prosaica, por que é totalmente verdadeira... a poesia mais irracional e materialista (empírica) da descrença só pode ser apreciada por quem é crente.

Como em toda realidade, o conflito é inevitável, a fé milita com a dúvida, pois utilizando do conceito de fé que é, “a certeza das coisas que não se vêem, mas se esperam” testificando que ter fé é ter certeza, e não esperança ou estímulo mental positivo como fazem os orientais, resta-nos a dúvida, descrença, para completar mais um duplo potencial de evento, justificando o movimento. São os extremos de uma corda, ou os dois pontos coordenados em um sistema cartesiano, ou os extremos de uma cisão na curva de uma função descontínua em uma equação não diferencial.

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